Um até breve que podia ser apenas um "como estás?"
8.6.18
Uma das coisas que todos nós ouvimos de bloggers e youtubers é a vontade de
partilharem apenas coisas "positivas" no seu espaço.
Felizmente sempre decidi escrever nas redes
sociais pedaços da vida, com o seu lado cor-de-rosa, mas também as outras
cores, incluindo os dias mais cinzentos ou fases mais negras da minha vida.
Quem me segue de outras andanças, conheceu um bocadinho da minha infância e adolescência, sabe um bocadinho das minhas lutas, da guerra e das vitórias que o tempo e a vida me foram ensinando.
Há já uns dias, desde o suicidio do jovem dj
Avicii, que sentia vontade em escrever, já estava em stand-by há muito tempo,
mas este assunto desperta em mim a necessidade em dar voz, em deixar palavras a
quem precisa ler e dar certezas de que eu também sei dar silêncio quando alguém
procura apenas um ouvido.
Tinha 17 anos quando ouvi pela primeira vez da
boca da minha médica a palavra "depressão". Era tão jovem ou estava
de tal maneira perdida nos meus dias que nem sequer me lembro de reagir a tal
noticia. Sei que tudo avançou com medicação, medicação que eu nem sabia muito
bem para que servia, mas ali estava eu a tomar vários comprimidos por dia na
esperança de ver aquele sufoco passar, de ver a vida melhorar ou com o simples
desejo de ser alguém que valesse a pena para outra qualquer pessoa.
Tudo se tratou, aos trambolhões lá me fui
levantando. Desisti da medicação com a mais pura certeza de que tudo estava
resolvido e que eu não precisava de mais nada. Que aquilo que a médica me disse
era pura invenção dela e lembro-me da frase que ela me disse naquela consulta,
"Ana, nunca mais nada será igual".
A minha vida mudou tanto que ali estava eu a
abraçar o Homem que seria a pessoa mais importante da minha vida. A felicidade
apesar de todas as coisas menos boas que nos foram acontecendo triunfou sempre
e confirmavam a cada dia, mês, ano que a minha vida estava onde deveria estar e
com quem eu merecia.
Três filhos depois ali estava eu de frente a
um corpo que nunca antes tinha visto tão grande, de caras com todas as memórias
que ali tinha vivido, com as feridas a sangrar, ainda abertas que eu sempre
tentei ignorar. Ali estava eu, caída. Ali estava eu de lágrimas nos olhos
encolhida naquela cama à espera que aquela dor, que aquelas lembranças saíssem
de mim.
As quatro paredes daquela casa passaram a
fechar-me, a cama era o meu espaço onde me aninhava, onde sentia aquela culpa
gigante por não ter forças para tratar dos meus homenzinhos.
Ele, foi ele que cuidou dos filhos e de mim.
Ele, ele lavava roupa e estendia. Ele fazia comer e tentava que eu os
acompanhasse, mas nada me levantava nem as lágrimas sumiam da minha cara.
Ele não se cansou de mim, ele cansou-se de me
ver a morrer aos poucos.
Depois de ele me acompanhar a vários exames
fomos novamente ao neurologista que me disse que eu tinha de ser acompanhada
sim, mas por uma colega dele, uma psicóloga.
E assim foi, numa primeira fase
medicação, que foi deixada para trás graças ao acompanhamento dela e
gradualmente. Ela não só era minha psicóloga como também
minha hipnoterapeuta e que diferença a hipnoterapia fez na minha vida. Que diferença!
Sabem o que é sentir a dor a deixar o vosso corpo? Sentir mesmo fisicamente?
É... a nossa aventura foi assim.
Aqui estou eu, quase dez anos depois,
não tenho mais feridas, mas serão para sempre cicatrizes.
Nunca mais tomei medicação para me
reerguer, hoje em dia uso abraços para me reconfortar. Sim, continuo a ter dias
menos bons, dias em que me apetece chorar sem razão, dias em que sinto que
estou a falhar algures ou que não sou suficientemente boa em algo.
É... deixei de fingir que está tudo bem,
não choro mais na companhia do barulho da água no duche. Não digo mais está
tudo bem quando o coração apetece dizer que algo está errado mesmo não sabendo
o que dói ou porquê.
Hoje, sem saber porquê, mas na esperança
de vos reconfortar, abro o meu coração convosco, mostro-vos as minhas
fraquezas. Hoje em dia toda a gente fala, partilha um mundo perfeito de tal
maneira perfeito que muitas das vezes temos receio em assumir que algo não está
bem com medo de acharmos que estamos erradas, que somos um problema, umas
falhas da sociedade. Mas não somos, não somos mesmo. Somos pessoas,
pessoas reais que nem sempre estão de sorriso nos lábios e a quem a vida nem
sempre é pintada da cor dos sonhos.
Não pensem que sou perfeita, que não
tenho dias menos bons porque tal como vos disse, a minha vida não é
cor-de-rosa, é de todas as cores.
E se me permitem, peço-vos que da
próxima vez que perguntarem a alguém se está tudo bem, esperem pela resposta
olhos nos olhos. Olhem atentamente. Escutem os outros, sem opinar. Escutem
apenas. Isso faz milagres.
E se um dia achares que aquela pessoa
que tem "tudo" não precisa de nada, escuta-a e quem sabe descobrirás
naquele seu silêncio o seu grito de alerta.
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